quinta-feira, 17 de maio de 2007

A influência brasileira no programa da Ségolène

obs: esta matéria foi "comprada" pelo editor de internacional de um grande jornal brasileiro que simplesmente resolveu não publicar nem dar satisfação para mim a tempo de vender a matéria para um outro veículo qualquer, na última semana da eleição presidencial na França.


Por trás das propostas da candidata do Partido Socialista à Presidência da França, Ségoléne Royal, há influência bem brasileira: o Orçamento Participativo, inventado em Porto Alegre(RS), cidade que virou santuário do altermundialismo depois de sediar os Fóruns Sociais Mundiais.

Enquanto o candidato da UMP, Nicolas Sarkozy, se apresenta como o “homem forte”, portador de soluções para “toda” França, a candidata socialista baseia seu programa na “democracia participativa”. É esse paradigma que norteia sua prometida reforma constitucional que, “com certeza irá mais longe do que está previsto na Constituição Brasileira de 1988”, afirma Yves Sintomer, diretor do Centro March Bloch, em Berlim, e professor na Paris VIII. Com novos mecanismos a serem introduzidos na carta constitucional francesa, Ségolène pretende estabelecer uma lei nacional que instituirá orçamento participativo em todo país, bem como formar “júris de cidadãos”, cujos membros, sorteados, terão a incumbência de avaliar a atuação dos políticos.

Um dos autores do livro “Porto Alegre: a esperança de uma outra democracia” (Editora Loyola), Sintomer colaborou com Ségolène na implantação do orçamento participativo das escolas secundárias públicas da região que ela preside, Poitou-Charentes. “Ela se inspirou em Porto Alegre, particularmente no que eu escrevi, para construir essa proposta”.

Pais, alunos, funcionários e professores debatem o uso da verba empregada nestes estabelecimentos de ensino com o objetivo de usá-la de maneira mais eficaz. Embora estas escolas sejam o destino de 25% do orçamento regional, ou seja, cerca de 124 milhões de euros, a comunidade escolar decide apenas sobre a finalidade de 10 milhões, ou seja, 8%. Essa cifra, no entanto, não fica tão longe dos 15% dos recursos postos em debate por seu modelo gaúcho. A idéia de o poder público abrir um debate, com regras claras, sobre a finalidade de um determinado recurso, inclusive concedendo aos cidadãos o poder de definir a ordem de prioridade dos projetos financiados, vem, segundo ele, “direto de Porto Alegre”.

Classificado como um dos “gurus” de Ségolène, o primeiro contato de Sintomer com o orçamento participativo ocorreu justamente no I Fórum Social Mundial, realizado em Porto Alegre, em 2001. Desde então, ele tornou-se um de seus principais divulgadores na França. Para ele, a capital gaúcha é um verdadeiro “laboratório da democracia”, pois, no momento em que possibilita que os cidadãos assumam diretamente a tomada de decisões, a cidade desenvolveu um “quarto poder”.

Além do orçamento participativo, Ségolène iniciou sua campanha eleitoral promovendo inúmeraveis encontros com habitantes das várias regiões do país, período que ela classificou de “fase de escuta”. Seu objetivo era conhecer as propostas e questões de seus eleitores.

Embora não considere isso propriamente como a instituição da “democracia participativa” na campanha eleitoral, já que a prerrogativa da decisão continuou sendo da candidata, Sintomer reconhece que ela instituiu uma “verdadeira ruptura” no jeito como a política vem sendo feita na França, até então monopólio dos partidos políticos.

Este estilo, entretanto, é visto com certo ceticismo. Para alguns de seus críticos, não passa de “populismo participativo” e uma boa jogada de marketing. De qualquer maneira, deve-se reconhecer que a primeira mulher a chegar tão perto do poder na França optou por uma caminho singular para vencer um candidato que, como Sarkozy, adota uma campanha de modelo clássico, apresenta um programa de governo acabado e seduz o eleitorado com uma postura quase marcial.

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