Durante a década de 80, nos fins dos anos da ditadura, o Rio de Janeiro fervia com suas associações de moradores. Talvez tenha ocorrido aqui neste período o mesmo que ocorrera em Porto Alegre. Muitos militantes de esquerda, sem outra alternativa de militância segura, passaram para as lutas comunitárias. São as associações de moradores o que está na origem do hoje, graças ao Governo Fogaça, moribundo Orçamento Participativo de Porto Alegre. A verdade é que a Prefeitura do PT, recém-eleita em 1988 com a bandeira da "inversão de prioridades", diante da falta de caixa para colocar a promessa em ação, resolveu afixar em um caminhão placas enormes onde expunha, de forma ambulante,o minguado orçamento da prefeitura para as várias comunidades onde, então, aguerridas associações de moradores cobravam as novas prioridades do novo governo.
Depois de morar onze anos em São Paulo, onde não vi rastro nem vestígio de associação de moradores, me surpreendi que essa militância existia no Rio. Aterrisei em um bairro peculiar neste quesito, Santa Teresa, mas isso me fez buscar informações e descobrir que esta cidade compartilhou da mesma efervecência comunitária da década de 80. Não sei como foi que se deram os processos por aqui, mas é fato que eu vejo que esta cidade ainda guarda importantes associações e um tecido social organizado, o que não é pouco. Estas associações não estão só no asfalto, estão também nas favelas onde cumprem um papel fundamental, como os correios comunitários. E deve ser bem difícil manter uma associação nas favelas, obrigada a andar em um espaço delimitado por um Estado ausente e um movimento "armado". Isto certamente torna muito mais complicado manter lutas sociais. Mas é fato que a permanência desses movimentos no Rio indica que há muito mais potencialidades políticas auto-organizativas nessa cidade do que a gente imagina. Vide os "transportes alternativos" geralmente criados onde os serviços oficiais não funcionam.... Que o carioca tem grande talento auto-gestionário, isso sabemos, visto a capacidade com que em várias localidades dessa cidade o pessoal se organiza para fazer uma festa, seja ela, junina, bloco de carnaval... etc.
Mas esse savoir faire vai mais além...senão não existiriam essas associações ainda pulsantes nessa cidade. Ouso até dizer que um governo que quisesse ser realmente transformador deveria começar justamente potencializando essas energias organizativas e não as coibindo ou as comprando com clientelismo e favores de ocasião. Mas, por enquanto, isso é querer demais... Do jeito que assistimos na TV, nas ruas e mesmo nas lutas do meu bairro, tenho chegado à conclusão que o grande problema do Rio são suas supostas "autoridades", geralmente desqualificadas para os cargos que ocupam. Nem tanto por incapacidade técnica, mas geralmente corrompidas por conchavos de todos os tipos, que, geralmente de forma autoritária, jogam na vala comum de negociatas o bem público e lamentavelmente, com muita frequência, desrespeita a vida de seus concidadãos menos afortunados economicamente. Mas acho que o povo, o cidadão carioca, sabe muito bem do que ele precisa. Geralmente não tem acesso a canais para fazer essa vontade prevalecer. Geralmente é humilhado, quando não obrigado a se curvar para obter o que lhe é de direito. Mas a vida e a consciência política pulsam nessa cidade. Muitas vezes está dissimulada. Mas está aí, viva. Um dia, quem sabe, virá à luz.
terça-feira, 17 de novembro de 2009
50 anos sem Villa-Lobos e a devoção brasileira ao violão
Talvez não tenha sido acaso que o extenso e riquíssimo Festival Villa-Lobos deste ano, que celebra o cinquentenário da passagem de Villa-Lobos por esta terra, tenha escolhido um mestre do violão para tocar sua obra integral hoje, dia 17, data em que Villa efetivamente faleceu há 50 anos atrás. Ao contrário dos dois outros concertos que assisti do festival, que além da grande qualidade da programação tem preços populares, foi neste que vi a maior afluência de jovens. Provavelmente jovens amantes do violão...violonistas...em devoção a uma obra que realmente é um marco para este instrumento não só no Brasil como no mundo.
Durante o concerto, dei-me conta que a primeira parte do programa, a Suíte Brasileira, Choros nº1, e os 5 Prelúdios, de fases diversas... fazem parte do meu repertório musical há anos. E que saudades de escutar essa sonoridade coloridos e elegante. Sim porque a música de Villa é colorida. Infelizmente um ataque de tosse me impediu de assistr os 12 Estudos que ele compôs pensano em André Segóvia.... Uma tragédia para mim. Mas nos trechos em que retornava à sala, quando esta imbecilidade conspirativa do meu corpo amainava, pude perceber que nesses estudos talvez residam toda a base do violão moderno brasileiro... não só o clássico. Sou uma devota do violão, portanto, não entendo os meandros desse intrumento... Só fico no seu encantamento....E pude perceber que, sim, boa parte dos grandes violonistas e compositores brasileiros tiveram que passar horas estudando Villa-Lobos.E sem dúvida é um privilégio.
O que fica é que, dada a platéia, a tradição brasileira do violão continuará produzindo novos violonistas, compositores e sua devota tribo de seguidores encatados pela sonoridade graciosa e colorida deste mágico instrumento sempre presente nas rodas popuares, mas também imortalizado por grandes mestres como Villa-Lobos.
Durante o concerto, dei-me conta que a primeira parte do programa, a Suíte Brasileira, Choros nº1, e os 5 Prelúdios, de fases diversas... fazem parte do meu repertório musical há anos. E que saudades de escutar essa sonoridade coloridos e elegante. Sim porque a música de Villa é colorida. Infelizmente um ataque de tosse me impediu de assistr os 12 Estudos que ele compôs pensano em André Segóvia.... Uma tragédia para mim. Mas nos trechos em que retornava à sala, quando esta imbecilidade conspirativa do meu corpo amainava, pude perceber que nesses estudos talvez residam toda a base do violão moderno brasileiro... não só o clássico. Sou uma devota do violão, portanto, não entendo os meandros desse intrumento... Só fico no seu encantamento....E pude perceber que, sim, boa parte dos grandes violonistas e compositores brasileiros tiveram que passar horas estudando Villa-Lobos.E sem dúvida é um privilégio.
O que fica é que, dada a platéia, a tradição brasileira do violão continuará produzindo novos violonistas, compositores e sua devota tribo de seguidores encatados pela sonoridade graciosa e colorida deste mágico instrumento sempre presente nas rodas popuares, mas também imortalizado por grandes mestres como Villa-Lobos.
segunda-feira, 2 de novembro de 2009
Hotel Santa Teresa: mais uma do François
Sem pejo de não atender às reclamações de seus vizinhos de que maneirasse nos barulhos e festas semanais que faz em seu estabelecimento sem tratamento acústico, François Delort, o dono do Hotel Santa Teresa, resolveu apelar para um juiz para impedir que seus vizinhos fizessem uma ação barulhenta em protesto contra seu descaso com a boa vinhança.
É interessante pensar o que se passa na cabeça desse juiz. Pode fazer manifestação, mas desde que seja silenciosa.
Onde já se viu manifestação silenciosa?
E esse cidadão francês, autor da ação, parece jogar no lixo toda a história de "droit des hommes" tão cara a seu país. Afinal, direito a se manifestar faz parte de uma das cláusulas pétreas dessa magnífica regulação, tão cara às lutas sociais do século XIX, XX e XXI....Este direito continua sendo, de fato, um fator de disputa, dependendo do país, mas o curioso é estarmos em um país dito democrático onde um juiz pode se dar o direito de impedir uma manifestação pública.... ferindo a nossa Constituição....
Bom, digamos que Delort agora colocou sua batata para arder. A vizinhança já o via com enorme desconfiança depois que ele demoliu um dos prédios mais antigos do bairro, reconstruíndo-o com um gabarito maior, ou seja, ocupando muito mais área construída de seus terreno, ferindo a legislação e, ainda por cima, tapando a vista de seus vizinhos.
Conta-se que ele simplesmente não resolve esse problema do barulho porque seu sistema de ar condicionado não funciona bem. Ora, mande consertar! Para quem gastou uma banana para fazer a demolição e reconstrução do hotel, essa parte do ar condicionado e do tratamento acústico não poderia ser deixada como detalhe. A não ser que ele realmente, como de fato demonstra, não dê a mínima para a boa vizinhança. Seu negócio é manter relação com a Coligação de Favelas de Santa Teresa que selecionou para ele os 80 funcionários do Morro dos Prazeres que trabalham no hotel. É uma questão de aritmética. Enquanto a "representativa" Coligação de Favelas defende o direito de seus 80 funcionários, que se lixem os seus vizinhos, menos afeitos às "migalhas" de sua política de "boa ação social". Que fiquem eles aguentando os barulhos de seus clientes, transmitidos diretamente pelas janelas abertas de seu estabelecimento chique, onde um hamburguer custa R$ 90 reais.
Me dei conta que essa luta curiosa contra o Delort em pleno "Ano da França no Brasil" expressa bem como funciona a nossa sociedade atualmente. Os ricaços fazem alianças com os escroques estrangeiros para desfrutarem do que supostamente é "chique" no mundo, dão migalhas em forma de "projetos pontuais", estilo ONGs, para as classes populares, fazem o maior marketing disso (sim porque supostamente o Canal Plus francês está fazendo um documentário sobre as "boas ações do Delort") e a classe média esmagada e politizada(que é este o caso de que se trata), que fique de bico fechado....pare de incomodar!
É interessante pensar o que se passa na cabeça desse juiz. Pode fazer manifestação, mas desde que seja silenciosa.
Onde já se viu manifestação silenciosa?
E esse cidadão francês, autor da ação, parece jogar no lixo toda a história de "droit des hommes" tão cara a seu país. Afinal, direito a se manifestar faz parte de uma das cláusulas pétreas dessa magnífica regulação, tão cara às lutas sociais do século XIX, XX e XXI....Este direito continua sendo, de fato, um fator de disputa, dependendo do país, mas o curioso é estarmos em um país dito democrático onde um juiz pode se dar o direito de impedir uma manifestação pública.... ferindo a nossa Constituição....
Bom, digamos que Delort agora colocou sua batata para arder. A vizinhança já o via com enorme desconfiança depois que ele demoliu um dos prédios mais antigos do bairro, reconstruíndo-o com um gabarito maior, ou seja, ocupando muito mais área construída de seus terreno, ferindo a legislação e, ainda por cima, tapando a vista de seus vizinhos.
Conta-se que ele simplesmente não resolve esse problema do barulho porque seu sistema de ar condicionado não funciona bem. Ora, mande consertar! Para quem gastou uma banana para fazer a demolição e reconstrução do hotel, essa parte do ar condicionado e do tratamento acústico não poderia ser deixada como detalhe. A não ser que ele realmente, como de fato demonstra, não dê a mínima para a boa vizinhança. Seu negócio é manter relação com a Coligação de Favelas de Santa Teresa que selecionou para ele os 80 funcionários do Morro dos Prazeres que trabalham no hotel. É uma questão de aritmética. Enquanto a "representativa" Coligação de Favelas defende o direito de seus 80 funcionários, que se lixem os seus vizinhos, menos afeitos às "migalhas" de sua política de "boa ação social". Que fiquem eles aguentando os barulhos de seus clientes, transmitidos diretamente pelas janelas abertas de seu estabelecimento chique, onde um hamburguer custa R$ 90 reais.
Me dei conta que essa luta curiosa contra o Delort em pleno "Ano da França no Brasil" expressa bem como funciona a nossa sociedade atualmente. Os ricaços fazem alianças com os escroques estrangeiros para desfrutarem do que supostamente é "chique" no mundo, dão migalhas em forma de "projetos pontuais", estilo ONGs, para as classes populares, fazem o maior marketing disso (sim porque supostamente o Canal Plus francês está fazendo um documentário sobre as "boas ações do Delort") e a classe média esmagada e politizada(que é este o caso de que se trata), que fique de bico fechado....pare de incomodar!
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