Pode parecer meio óbvio, mas
sempre convém relembrar: o nome do país que nascemos vem de uma árvore que praticamente foi
extinta, dada a sanha predatória dos europeus que aqui chegaram. E essa lógica,
a do “pau-brasil”, permanece. Só isso
explica, a meu ver, o transformismo e a mediocridade política de um partido que
nasceu vinculado à defesa de bandeiras ainda válidas como a desmilitarização da
polícia, a reforma agrária, a reforma política, a distribuição de renda e a diminuição das
desigualdades sociais gritantes que herdamos, aprofundada pelos 20 anos de
regime militar.
Tudo bem, o PT pode até
alegar que distribuiu renda nos 12 anos que esteve no poder. Mas foi baseando-se
na lógica predatória. Aproveitou-se de mais um ciclo expansivo da nossa
história, mas não redistribuiu a riqueza mais abundante e importante que temos:
TERRA.
Ou seja, o custo disso será alto
em relação a seus benefícios, dada a miopia política reinante. Ciclos
econômicos expansivos sempre tivemos na nossa história, baseando-se, claro, em
algum produto primário como o pau-brasil, que nem plantado era, sendo simplesmente
extraído, assim, como toda a Mata Atlântica que o rodeava no litoral
brasileiro.
Hoje temos a soja, predando o cerrado e
deixando atrás de si a falta d’água e o fim de alguns rios, visto que, segundo alguns estudiosos, como Altair Sales
Barbosa (http://www.jornalopcao.com.br/entrevistas/o-cerrado-esta-extinto-e-isso-leva-ao-fim-dos-rios-e-dos-reservatorios-de-agua-16970/) não é só o desmatamento da Amazônia o
responsável pela estiagem no nordeste. O cerrado, que fica no imenso planalto
central brasileiro, bioma mais antigo do
Brasil, está extinto, dada a correção do solo de lá para plantar soja. E o
pior: ele funcionava como uma caixa
d’água para o resto do país, graças às raízes subterrâneas de sua vegetação
centenária. Junto com o cerrado, vários pequenos rio e riachos de lá foram
terminando. Não é só o superpopuloso e problemático Sudeste que vai sofrer com
isso. Só para ter uma idéia, tanto o Rio São Francisco, hoje moribundo, como o Rio Amazonas dependem de nascentes que
se originam no cerrado.
É importante frisar que o
inchaço das grandes cidades do Sudeste não são fruto de geração expontânea. Não
fosse a lógica predatória, não seríamos um país relativamente despovoado no
sertão. Sim, temos 8,5 milhões de kilômetros
quadrados de extensão territorial, bem mais do que os 3, 2 milhões de
kilômetros quadrados da Índia, que sustenta 1,2 bilhão de pessoas, mas temos a
maior parte da população brasileira concentrada no litoral, mais
especificamente do Sudeste, algumas delas passando bem mal. Não que a Índia
seja um bom modelo, mas nós temos menos densidade populacional que os Estados
Unidos, que tem 33 pessoas por kilômetro quadrado. Nós, apenas 24 pessoas por kilômetro quadrado.
Mas porque tanta gente no
litoral e no Sudeste? Basicamente, de 1960 a 1980, 30 milhões de brasileiros
saíram do campo, buscando aplacar a falta de acesso à terra que os jogava na
miséria e na dependência. Alguns deles foram simplesmente expulsos de seus
míseros 1 alqueire de terra, onde plantavam para sobreviver e vendiam o seu
excedente. A lógica predatória no Brasil é tão intensa que com a promulgação
das leis trabalhistas para o campo, em 1962, muitos proprietários de terra
resolveram expulsar os moradores e posseiros que viviam em suas fazendas para trocá-los
pelos insumos e maquinários bancados pelos juros subsidiados fornecidos
fartamente pela ditadura militar. Mais
“econômico” do que assinar carteira assinada ou correr o risco de perder um
naco de terra para pessoas que viveram décadas em sua “propriedade”. Somos tão
predatórios que grande parte das terras dessas “propriedades”, cada qual
vinculada a alguma expansão econômica lucrativa de algum produto primário como
o café e a cana-de-açúcar, são degradadas. Estima-se que no Brasil há 100
milhões de hectares de terras degradadas. E olha que temos 840 milhões de hectares.
Portanto, não é pouco. Basta andar na Via Dutra e ver aqueles morros pelados
cheios de voçorocas para entender do que se está falando.
Mas voltando ao PT. A
mediocridade do PT é tão grande e
supreendente, que seria difícil imaginar lá pelos início do ano 2000 que
teríamos uma Ministra da Agricultura nomeada por um governo do PT, dizendo que
não há mais latifúndios no Brasil. Ela deve ser meio cega, porque basta viajar
pelas estradas e ver tanta terra inculta, mal aproveitada e concentrada. Segundo o IBGE, 69 mil proprietários de terra
detêm 228 milhões de hectares. Bem mais
terra do os índios que, segundo a própria Kátia Abreu, seriam latifundiários: são cerca de 900 mil brasileiros que vivem em
112 milhões de hectares. Ou seja, nada comparado com o naco de terra que
concentram 69 mil brasileiros que ainda a devastam, sem às vezes deixar um pé
de árvore ou mata nativa em pé.
Por sinal, ao contrário dos
ruralistas representados pela Ministra, são esses brasileiros de etnia indígena,
assim como os demais posseiros e povos tradicionais que vivem no interior do
nosso país os que geralmente preservam e defendem as nossas florestas. É por
conta da maioria deles que somos ainda um país com imensa biodiversidade.
Se fosse deixar para os
ruralistas, seríamos uma paisagem degradada e monocultora. Talvez até
tivéssemos que importar mais feijão do que importamos hoje, imaginem da onde?
China! Sim, vendemos soja que não comemos para a China e importamos feijão, a
base de nossa dieta alimentar. Somos dependentes do feijão chinês, acreditem se
quiserem!
Mas a verdade mesmo é pior.
Diversos geógrafos agrários brasileiros, como Ariovaldo Umbelino de Oliveira,
estimam que cerca de 80% das terras privatizadas do Brasil são pura grilagem.
Apropriação indébita do patrimônio que é de todos brasileiros de qualquer cor.
E nas barbas do Estado, quando não com seu franco consentimento, favorecendo
pessoas bem informadas dos lugares onde as estradas de rodagem, ferrovias ou
outros investimentos estatais iam ser feitos.
E danem-se quem estivesse no caminho. A própria Ministra Kátia Abreu,
quando era senadora do DEM, é uma dessas que também tem nas costas a conta
de ter expulsado famílias de pequenos agricultores de suas terras. No caso
dela, ela expulsou a família do agricultor Juarez Vieira Reis, das terras onde ele havia
nascido em 1948, em uma espécie de reforma agrária invertida que beneficiou justamente
ela e outros apaniguados do ex- governador do Tocantins Siqueira Campos. Na
época da reportagem que conta esta
história, publicada na Carta Capital por Leandro Fortes, Katia Abreu estava assumindo
pela primeira vez a Presidência da CNA (Confederação Brasileira de Agricultura).
E prometia: “remover os preconceitos” isolavam os ruralistas do restante da
sociedade brasileira, por serem vistos como “protótipos do atraso”.
Pois é, não sei o que
ocorreu, mas é fato que durante os anos PT na presidência, figuras como o fundador da violenta UDR (União
Democrática Ruralista), como Ronaldo Caiado, e a própria Kátia Abreu, a “miss motoserra de ouro”, viraram políticos respeitáveis,
até com cacife político para ocupar o lugar de destaque que hoje eles têm e
fazer a infâmia de trabalhar para mudar a Constituição no que se refere aos
direitos indígenas.
Como chegamos a isso? Eis a
questão. Não venham me dizer que é porque precisamos das reservas que a
exportação da soja traz para os cofres públicos? De que adianta ter dólar no Banco Central se
nos faltar o mais básico e necessário de tudo? ÁGUA